O homem que partiu uma montanha ao meio sozinho, e linguagens de programação em português
Dashrath Manjhi nasceu em 1934, em uma pequena aldeia do estado de Bihar, na Índia, muito próximo do Nepal e de Bangladesh. Fugiu de casa em uma idade jovem e trabalhou em minas de carvão em Dhanbad, mais ao sul. Mais tarde, retornou à aldeia de Gehlaur, se tornou um trabalhador agrícola, e casou-se com Falguni Devi.
Falguni ajudava o marido no seu trabalho, levando água e almoço para ele. O local de trabalho era longe da aldeia, ao sul de uma montanha rochosa e íngrime, e todo o acesso era a pé, obrigando as pessoas a contornarem a montanha dependendo das condições. Gehlaur era (e continua sendo até hoje) uma pequena aldeia com poucos recursos e, embora esteja localizada em uma planície, é delimitada ao sul por uma crista de quartzito de idade mesoproterozoica (1-1,6 bilhão de anos) em ascensão íngreme, que impedia o acesso rodoviário à cidade de Wazirganj, uma cidade maior e com mais recursos.
Certo dia, Falguni caiu dessa montanha ao levar os suprimentos para Dashrath, e se feriu gravemente. A aldeia não possuía médico de plantão, e o atendimento médico mais próximo ficava a 70 quilômetros de distância, muito por causa da montanha em si. O atendimento médico atrasou, e Falguni pereceu. Uma morte bastante evitável, e que trouxe uma dor tremenda a Dashrath, agora viúvo.
A experiência do luto fez Dashrath resolver cortar uma estrada através da crista para tornar sua aldeia mais acessível. Dashrath sentiu que a perda de sua amada esposa poderia ter sido evitada, e também desejava poupar a próxima pessoa de ter que experimentar um destino semelhante, então sentiu-se determinado a esculpir um caminho através da crista da montanha, para que sua aldeia pudesse um dia ter acesso mais fácil aos cuidados médicos.
Ele disse: "Quando comecei a martelar a colina, as pessoas me chamavam de lunático, mas isso fortaleceu minha determinação.". Inicialmente apenas com cinzel, martelo, e um carrinho para carregar entulho, Dashrath começou a dividir a montanha ao meio. No início, era zombado pelos próprios aldeões, mas continuou, dia após dia. Mais tarde, Dashrath disse: "Embora a maioria dos aldeões tenha me zombado no início, houve alguns que me apoiaram depois, dando-me comida e ajudando-me a comprar minhas ferramentas.".
O trabalho durou 22 anos, de 1960 a 1982. Dashrath esculpiu um caminho de 110 metros de comprimento, 7,7 metros de profundidade em alguns lugares e 9,1 metros de largura, para formar uma estrada através da crista de rochas. A latitude e longitude são aproximadamente 24°52′37″N 85°14′35″E. O novo caminho reduziu a distância entre os setores de Atri e Wazirganj, do distrito de Gaya, de 55 para 15 quilômetros, permitindo o trânsito seguro de pedestres, veículos de tração e automóveis. O governo local asfaltou a nova estrada apenas depois da morte de Dashrath Manjhi, em 2007.
Sua vida rendeu homenagens, ainda em vida, e póstumas, na forma de documentários e filmes. O primeiro deles foi um personagem coadjuvante baseado em Manjhi no filme em língua canarês (Kannada) de 1998, Bhoomi Thayiya Chochchala Maga ("Motherland's First Son", em inglês, e "O Primeiro Filho da Terra-Mãe", em português). Em 2011, o diretor Kumud Ranjan, trabalhando para a Divisão de Filmes da Índia, de propriedade estatal, produziu um documentário baseado na vida de Dashrath Manjhi intitulado The Man Who Moved the Mountain (O Homem que Moveu a Montanha). Em agosto de 2015, um filme em hindi, Manjhi – The Mountain Man, foi lançado e bem recebido. O filme foi dirigido por Ketan Mehta. O primeiro episódio da segunda temporada do programa de TV Satyamev Jayate, apresentado por Aamir Khan, transmitido em março de 2014, foi dedicado a Dashrath Manjhi.
Um homem, sozinho, foi capaz de dividir uma montanha ao meio para fazer o que era certo. Não esperava ajuda financeira. Apenas desejava trazer melhoras para o povo de sua aldeia, o mesmo povo que zombou de sua ideia, devido ao tamanho do esforço, talvez julgando ser algo impossível, e que faria Dashrath desistir no meio do caminho.
Essa história nos inspira enormemente. Começamos com uma linguagem de programação, 100% em português. Fomos zombados e ridicularizados por outros desenvolvedores, seja puramente por ser em português, seja porque "a linguagem não tem aplicação comercial", por desenvolvedores que acreditam "estar ajudando outras pessoas a se tornarem desenvolvedoras".
Este post teve 1,7 mil likes no X. É um meme que começa com um suposto terapeuta dizendo que "C Brasileiro não é real, pode machucar você", e um código em português. Respostas derrogatórias habituais à parte, há algumas bem curiosas, que até admitem que programar em português é realmente mais fácil.
A autossabotagem do povo que fala português nos é algo muito interessante. Acreditamos que seja a falta de divulgação de estudos como este, que mostram 30 a 35% de ganho de retenção e desempenho em uso de linguagem de programação na língua materna.
Mesmo assim, persistimos. A linguagem de programação ajudou a criar outras quatro: uma de estruturação de páginas de internet, uma de estilos, uma de consulta a bancos de dados, e uma representação intermediária para compiladores. Elas são em código aberto, e podem ser acessadas aqui. Também desenvolvemos diferentes aplicações para demonstrar essas linguagens funcionando, bem como um framework Web, em que todas essas linguagens funcionam juntas para criar aplicações comerciais. E para quem quer estudar essas linguagens, já existem aplicações educacionais que você pode estudar brincando, como Stardust.
Dashrath Manjhi nos inspira todos os dias, e assim como ele teve outros poucos aldeões ajudando, também temos uma pequena comunidade crescendo. Com a ajuda da Cumbuca Dev, estamos levando as linguagens para pessoas que nem imaginam que elas existem. Em um dos tutoriais que fizemos em Belém do Pará, uma mãe levou suas duas crianças para um tutorial com linguagens em português. A mãe é Engenheira de Dados. Ao final do tutorial, as crianças nos disseram que "finalmente elas entendem o que a mãe delas faz".
O caminho é claro, e seguiremos persistindo. Um passo de cada vez, para no futuro termos aplicações comerciais escritas 100% em português.