A Inteligência Artificial Está Nos Deixando Mais Burros?
“A alma é, de certo modo, todas as coisas.”
— Santo Tomás de Aquino, De Anima
Introdução: Um mundo mais inteligente… ou apenas mais automatizado?
Nos vendem a promessa de um futuro onde tudo será mais rápido, mais inteligente e mais fácil. Mas quando tudo se torna fácil, o que acontece com a virtude do esforço? Esse dossiê nasce de uma inquietação pessoal e filosófica: quanto mais delegamos à inteligência artificial as funções que antes exigiam esforço cognitivo, mais nos tornamos frágeis diante da vida real.
Afinal, quem pensa por você... te forma ou te substitui?
1. O que dizem os dados: IA e declínio cognitivo
Pesquisas robustas vêm mostrando um padrão preocupante: o uso excessivo de inteligência artificial tende a atrofiar nossas faculdades mentais.
Um estudo do MIT Media Lab revelou que estudantes que usaram IA para redigir textos apresentaram menor atividade cerebral, raciocínio mais superficial e maior dependência da máquina. Eles também tiveram piores desempenhos em testes subsequentes quando comparados a estudantes que fizeram os mesmos exercícios manualmente ou apenas com buscadores como o Google.
“O uso da IA reduz o esforço cognitivo e desencoraja o pensamento metacognitivo.” — MIT, 2023
Outro relatório, da Carnegie Mellon e Microsoft Research, indicou que profissionais que usaram IA em tarefas complexas tomaram menos decisões críticas e tiveram menor diversidade de soluções.
Isso não é apenas preguiça mental, é o começo de uma erosão silenciosa das potências da alma racional.
2. A geração que pensa menos: o efeito Flynn reverso
De acordo com o chamado “efeito Flynn reverso”, o QI médio da população tem diminuído desde os anos 1990. Isso foi identificado em países como Noruega, Dinamarca, Reino Unido e até nos EUA.
Um estudo da Northwestern University analisou 400 mil testes entre 2006 e 2018 e revelou queda constante em habilidades como raciocínio lógico, verbal e espacial.
“Esta é a primeira geração na história moderna com um QI menor que a dos seus pais.” — Dr. Michel Desmurget, neurocientista, autor de A Fábrica de Cretinos Digitais
Será coincidência que isso ocorra justamente quando passamos a terceirizar nossas decisões, nossa memória e nossa linguagem?
3. Gerações conectadas, mas desconectadas do pensar
Jovens da Geração Z e Alpha são expostos à tecnologia desde o berço. São ágeis nos dedos, mas estão perdendo o que Maryanne Wolf, autora de O Cérebro no Mundo Digital, chama de “leitura profunda”.
“Leitores digitais estão perdendo a capacidade de refletir profundamente, fazer conexões e interpretar nuances.” — Maryanne Wolf
Um jovem pode escrever um ensaio inteiro com IA, mas não consegue sustentar uma ideia por si só. É como se a alma racional perdesse sua intuição por depender da máquina — uma inversão perigosa da ordem natural: o servo (a tecnologia) se tornando senhor.
4. Consequências para as futuras gerações
O que acontecerá com uma sociedade onde ninguém mais precisa pensar de verdade? O filósofo Byung-Chul Han já nos alertou sobre o “desaparecimento do outro” e a redução da experiência à informação processada por algoritmos.
Mas em termos tomistas, isso é ainda mais grave: se a alma humana é composta por potências — intelecto, vontade, memória — e deixamos de exercê-las, estamos abrindo mão da nossa essência racional.
Estamos formando gerações sem hábito intelectual, sem fortaleza de espírito. E a inteligência, se não é exercida com liberdade e prudência, torna-se apenas uma simulação.
5. Como reagir: sugestões concretas e espirituais
a. Educação crítica em IA
Introduzir nas escolas uma educação ética e filosófica sobre inteligência artificial, conforme recomenda a UNESCO. Ensinar o funcionamento e os limites da IA, para que ela seja vista como instrumento, não autoridade.
b. Evite o “atalho fácil”
Não comece um texto pedindo tudo para o ChatGPT. Pense, rascunhe, escreva — depois revise com IA, se necessário. Isso fortalece o hábito da reflexão e da formação intelectual.
c. Leitura, escrita e silêncio
Cultive a leitura de livros físicos. Escreva à mão. Faça exercícios mentais analógicos, como xadrez, música ou caligrafia. Busque momentos de silêncio interior, como propõe a tradição cristã: o silêncio é o útero da inteligência.
d. Moderação no digital
A exposição exagerada às telas causa déficit de atenção e redução de plasticidade cerebral. O Dr. Desmurget recomenda tempo de tela limitado, com propósito definido.
“O intelecto precisa ser cultivado com disciplina e desejo pela verdade.” — Tomás de Aquino, Suma Teológica I, q.84
Conclusão: A IA como servo, não como senhor
A tecnologia deve servir ao ser humano, e não moldar o que significa ser humano. Usar IA com sabedoria é um bem; entregar a ela nosso raciocínio, é um erro.
A verdadeira inteligência não está na rapidez com que encontramos respostas, mas na profundidade com que formulamos as perguntas.
A inteligência artificial pode sugerir. Mas a inteligência racional humana é chamada a discernir — e isso é tarefa da alma, da razão iluminada pela verdade.
Referências:
- MIT Media Lab: How People Use Generative AI Tools
- Microsoft + Carnegie Mellon: The Problem with AI Feedback
- Scientific American: The Reading Brain in the Digital Age
- UNESCO: Ethics of Artificial Intelligence
- Northwestern University: Trends in Intelligence Decline
- Michel Desmurget – “A Fábrica de Cretinos Digitais” (livro)