Pare de apenas assistir aulas.
Porque temos uma geração de copiadores e não programadores.
Isso não é um conteúdo técnico, é apenas uma percepção que tenho.
Antes de tudo, quero logo deixar bem claro que esse título não é um clickbait. Trata-se de uma percepção que venho tendo sobre o mercado atual e os novos programadores que estão sendo formados e que querem dar um pontapé inicial na profissão. E talvez até de alguns que já estão inseridos.
A geração mais nova, viciada em dopamina, em vídeos curtos e em resultados rápidos, está muito mais focada em dar “check” em uma to-do list de tópicos a serem estudados do que, de fato, aprender e formar um conhecimento sólido. Se você é um desses e já está me xingando logo no primeiro parágrafo, desafio você a se lembrar de algo que viu em uma video aula ou aula da faculdade há um tempo atrás. Aposto que deu o check para ganhar pontos na maldita gamificação, teve um pico de dopamina, mas esqueceu o principal: o que o professor quis ensinar. Se você não é do tipo “mimimi” e quer de fato evoluir como ser humano e profissional, continue lendo e se prepare, porque ao ler você poderá ter a sensação de levar vários socos no estômago. Mas veja pelo lado bom: é melhor corrigir um problema cedo do que postergar isso para a vida toda. Existe um ditado bem simples que eu levo como lema para minha vida: a verdade pode doer, mas só na hora. A mentira dói pelo resto da vida. E, por favor, não mate o mensageiro.
Antes que você, leitor, pense que sou um “cagador de regra”, que só estou enchendo o saco com esse texto, deixe-me dar uma carteirada aqui. Atuo na área de desenvolvimento de software há quase uma década e meia e passei por todos os estágios da carreira, desde estagiário até ser Head de Tecnologia em uma startup (minha posição atual, diga-se de passagem). Então acredito que tenho um pouco de propriedade para falar sobre isso. E, como aqui existem outros muito mais experientes que eu, que talvez já ajudaram a construir coisas realmente grandes, acredito que irão corroborar com minha ideia. E se não concordarem, paciência — nem Jesus agradou a todos.
Um ponto alarmante sobre o qual quero discorrer é como já somos moldados a dar check nas coisas desde a escola. Sim, na escola de ensino fundamental e médio. Saca só esse dado: 94,5% dos estudantes do ensino médio não dominam matemática em Santa Catarina fonte— reportagem de poucos meses atrás. (Estou usando como referência o estado onde cresci e vivo até hoje, mas isso é reflexo nacional, não apenas local).
Mas o que isso tem a ver? Tudo. Pense comigo: você passa algo como 12–13 anos da sua vida na escola, entre ensino fundamental e médio, na faixa dos 5–6 aos 17–18 anos. Ali você se depara com um professor passando conteúdo. Sua única função é absorver e colocar em prática. Porém, na maioria das vezes, você apenas absorve e não põe em pratica. No máximo, vira um repetidor do que o professor faz. Se ele muda um valor de variável ou constante, você já se perde, porque só assistiu, mas não testou outras formas. Qualquer semelhança com o estudo de programação é apenas umamera coincidência. SQN
Diante disso, dá para perceber como essa ânsia por obter dopamina momentânea de dar check em um assunto pode ser nociva ao futuro? Um ponto é que, na grande maioria dos bootcamps, cursos e formações disponíveis hoje, existe uma gamificação excessiva. “Olha só que legal, você é o nível "master blaster jedi” agora porque deu check em 347 aulas.” Mas e aí, o que você realmente aprendeu nessas 347 aulas? Coloque em prática sem copiar os exemplos da aula. Crie algo análogo ao que foi mostrado em vídeo. Eu sinceramente duvido que você consiga tirar as rodinhas da bicicleta e andar por conta própria.
O check em um assunto só é verdadeiro quando há entendimento real. A aula é apenas uma ferramenta, um meio para alcançar aprendizado genuíno. O problema surge quando você coloca a aula como objetivo final: “Fiz a aula, dei check nas 876 aulas da formação e agora sou um profissional pronto para entrar no mercado, aplicar para vagas internacionais e ganhar 45 mil reais mensais.” Está cheio de curso por aí prometendo isso em seis meses. Grande bullshit. Como dizem: todo dia sai de casa um malandro e um ingênuo. Quando eles se encontram, fecham negócio.
Aqui vai uma dica valiosa para os seus estudos: em vez de querer pular de assunto em assunto, domine de verdade aquilo que se propõe a aprender. Um exemplo esdrúxulo, mas que faz sentido: devo usar else para tudo, sim ou não? Não sei. Teste. Construa vários pequenos programas que usem muitos if/else aninhados e depois tente reescrever para reduzir ou eliminar o uso de else. Ou aplique alguns for aninhados e tente refatorar para que o programa não dependa dessa estrutura. Esse é um exemplo pequeno, mas certamente vai ajudar você a refletir se realmente dominou o assunto.
O domínio vem quando você sai do ambiente controlado da videoaula, põe a mão na massa e recebe um erro inesperado. Aí sim, volte ao vídeo e veja se esqueceu alguma etapa. Ou vá ao Stack Overflow e pesquise pelo erro para encontrar soluções. (Sim, recomendo Stack Overflow para que você aprenda a fazer uma pesquisa minimamente decente, em vez de esperar que o ChatGPT entregue a resposta de mão beijada).
No fim das contas, a mensagem central é simples: assistir aula não é o mesmo que aprender. A aula é apenas o meio — o aprendizado verdadeiro acontece quando você põe a mão na massa, erra, refaz, pesquisa, discute e, finalmente, domina o assunto. Enquanto continuarmos presos à mentalidade de checklist e gamificação vazia, continuaremos formando mais copiadores de código do que programadores de verdade.
O mercado de tecnologia já está saturado de pessoas que sabem repetir tutoriais, mas se perdem quando precisam criar algo do zero. O que diferencia um profissional mediano de um excelente é a profundidade do conhecimento, a capacidade de resolver problemas sem receita pronta e a coragem de enfrentar o desconhecido sem medo de quebrar a cara no processo.
Por isso, fica aqui o convite: vamos debater esse tema!? Você concorda com essa visão de que estamos formando uma geração de copiadores? Ou acredita que essa forma gamificada de aprender pode ter seu valor? Talvez você tenha exemplos práticos que contrariam essa percepção, ou até ideias de como transformar a forma como estudamos programação hoje.
Independente de concordar ou discordar, o mais importante é gerar reflexão. Só assim conseguimos elevar o nível da nossa comunidade e formar não apenas profissionais que sabem dar “check” em aulas, mas pessoas capazes de construir, inovar e transformar a tecnologia em algo realmente útil.
AMDG