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🤯 Como minha ruína está me reinventando

Sou Daniel, moro em Santos/SP, tenho 42 anos e sou dev há 13 anos. Além disso, pode adicionar mais 10 anos aí do meu início de carreira limpando impressoras, instalando servidores Linux/Windows, passando cabos de rede e dando suporte técnico diretamente na mesa do usuário totalizando 23 anos de experiência trabalhando com computadores. Pra você traçar mentalmente um pouco do meu perfil, imagine que em um prédio de aproximadamente 400 pessoas usando Windows, eu era a única pessoa que usava Linux, só porque um colega disse que "não era possível trabalhar usando Linux" e eu aceitei o desafio.

Meu primeiro computador foi um 286 mas o primeiro computador que mexi na vida mesmo foi o MSX, da Gradiente. Cheguei a escrever um jogo usando BASIC nele que resultou em algo bem feio mas eu achava aquilo mágico, letras que viravam diversão. Sem falar no leitor de fitas K7 que era a mídia da época e fazia "som de modem".

Fui fazendo upgrades à partir do meu 286 até chegar ao 686, processador que não fez muito sucesso na época, principalmente devido ao lançamento próximo do Pentium, o primeiro que conseguia rodar MP3 sem travar, uma tecnologia muito recente na época. Embora eu tenha passado por várias gerações de CPU e tecnologias de armazenamento em memória, eu sempre terei um carinho especial pelo IBM Aptiva, equipado com o delicioso Intel i486 DX2 66. Quem teve lembra da sensação de apertar o botão "TURBO".

Avançando no tempo, já na carreira dev, comecei trabalhando pra consultorias e em projetos para empresas grandes. Em uma determinada situação, por exemplo, fui responsável por construir sozinho o sistema que permitiu que um grande banco brasileiro oferecesse empréstimos para seus clientes, efetuando as transferências necessárias para as devidas contas no final do dia. Nessa época, me dedicei à stack Microsoft e me tornei especialista em ASP.NET ao ponto de obter uma certificação MCTS em web development. Eu adorava escovar bits e construir coisas poderosas e performáticas.

Nessa fase, trabalhei pra inúmeras empresas de muitos setores como governo, educação, política, seguros, bancos, logística e tantos outros. Perdi a conta de quantas empresas, projetos e clientes tive contato. Eu era o profissional que era colocado nos projetos para "apagar incêndios", par mitigar problemas. Quando o cliente já não estava feliz com o andamento do projeto, me convocavam pra botar as coisas nos trilhos novamente e eu era retirado do projeto uma vez que a missão estivesse cumprida e colocado em outro projeto problemático. Acho que isso se deve a uma parte da minha personalidade que me define como "mediador", "moderador". Eu consigo entender todos os lados de um conflito e negociar e convencer as partes a se encontrarem em algum ponto no meio do caminho em prol do bom andamento do projeto.

Ao final da fase de consultorias, aceitei trabalhar pra um grande amigo. Aceitei receber um salário menor mas em contrapartida eu trabalharia bem perto de casa, o que me economizaria algumas horas do dia que eu gastava todo dia durante 8 anos trabalhando na capital Paulistana. Eu havia finalmente sido contratado como Arquiteto, um dos maiores cargos técnicos aqui no Brasil.

Aí veio a pandemia...

Infelizmente, meu amigo teve que fechar a empresa e eu (e meus colegas) fiquei desempregado.

Depois de um tempo me ajustando e fazendo trabalho freelance, um amigo me indicou pra me candidatar a uma vaga numa empresa gringa. Nesse momento, a síndrome de vira-latas bateu forte. Apesar de eu falar inglês desde minha adolescência, eu travei, achei que não era capaz. Mesmo com tanta insegurança e tantas incertezas infundadas, eu me candidatei afinal o "não" eu já tinha, então agora era só correr atrás da humilhação :D

Após 2 meses e 5 entrevistas em inglês, com várias pessoas às vezes ao mesmo tempo (culture panel, por exemplo), com a esposa ouvindo atrás da porta pra dar feedback, eu fui contratado aos 45 do segundo tempo, quando minhas economias já estavam acabando.

Foi a melhor fase da minha vida onde eu ganhava bem, era respeitado como profissional e como pessoa, tinha colegas de trabalho que realmente se importavam comigo e eu com eles. Cheguei a assistir o casamento de um colega da Flórida, com uma japonesa no Japão, ao vivo! Eu tinha colegas espalhados por todo o planeta, EUA, UK, Japão, China, Quênia, Barbados (terra da Rihana), etc, com sotaques variados como americano, britânico, indiano, australiano, queniano, ganês, árabe. Já falei do indiano? Acho que foi o maior desafio, entender e acostumar com o sotaque indiano.

Depois de quase 3 anos nesse ritmo, morando num apartamento confortável, veio a primeira onda de layoffs. Eu consegui sobreviver a essa mas o amigo que me indicou pra essa empresa, não. O que é curioso é que eu considero esse meu amigo muito melhor tecnicamente, apesar de minhas habilidades com a lingua inglesa serem melhores. Logo em seguida, veio um hackathon de inteligência artificial pois nosso CEO estava muito impressionado com as possibilidades e durante o hackathon, veio a segunda onda de layoffs. Dessa vez, eu não pude permanecer na empresa. Fui dispensado. Entrei na Ceros recebendo 100k USD por ano e saí recebendo 115k USD por ano. Faça as contas.

Depois do ocorrido em Agosto de 2023, resolvi tirar um período sabático pra me preparar pra cuidar de minha filha, que passaria por uma cirurgia complexa de coluna para corrigir escoliose em Dezembro de 2023. Pude me dar esse tempo pois eu consegui acumular uma boa quantidade de dinheiro trabalhando pra uma empresa americana e morando num país de terceiro mundo como o Brasil. Após a cirurgia e recuperação de minha filha, percebemos que ela estava bem e resolvi voltar a procurar um emprego.

Aqui tem um acontecimento importante. Depois de trabalhar com vanilla Javascript, Typescript e React na Ceros, resolvi pivotar minha carreira pra esse mundo Node.js. Acabei me apaixonando pela stack, pela possibilidade de usar a mesma linguagem de programação full-stack e é nessa direção que quero guiar minha carreira deste momento em diante.

Após me candidatar a algumas vagas, percebi que eu havia ficado no passado. Eu não tinha side projects relevantes e não era conhecido na bolha dev. Não importava se eu havia construído coisas magníficas, ter solucionado grandes problemas pra grandes empresas, construído inúmeros sistemas do zero. Nada disso importava no mercado atual. O que importava agora era:

  • O que você construiu e enviou pra produção nos últimos dois anos?
  • Pra quais Startups você trabalhou nos últimos 2 anos?
  • Quem famoso você conhece na bolha dev?

Eu não tinha nada disso e resolvi começar a criar um projeto pessoal, juntamente com meu amigo que havia sido dispensado antes da Ceros, pra oferecer um componente React pra ícones, que funciona tanto na web quanto no native, com o poder do Tailwind. Assim nasceu o Rocketicons (https://rocketicons.io). Lançamos e… flopou. Aparentemente, ninguém quer saber de ícones. Ninguém dá importância a ícones em seus SaaS e side projects.

Depois do Rocketicons, continuei me candidatando a vagas, fazendo entrevistas e testes técnicos. Ao todo, já me candidatei a 584 vagas ao longo de 449 dias desde que saí da Ceros até hoje. Quando estava novamente quase sem reserva financeira, surgiu uma nova oportunidade numa outra empresa americana mas ganhando 48k USD por ano. Infelizmente muitos devs deixaram a empresa e quem ficou, reclamava do salário então a decisão da empresa foi demitir o “new guy” (eu) e canibalizar meu salário em prol dos outros profissionais brasileiros que já estavam lá há mais de 1 ano. Isso durou 6 meses e até pouco tempo estava me causando prejuízo ter essa experiência em meu CV no LinkedIn pois todo entrevistador já perguntava logo porque eu fiquei tão pouco tempo nessa empresa, então resolvi tirar de lá e colocar a experiência relacionada como “freelance”. Essa foi minha segunda queda no mundo dev.

Após isso, resolvi testar o que raios era esse tal de “vibe code” que todo mundo estava falando e pra minha surpresa, desengavetei e lancei um projeto completo com quase 80 mil linhas de código em 3 semanas. Um projeto que eu já queria ter feito há pelo menos 10 anos, uma API de gamificação chamada LuduStack (https://ludustack.com). Fiquei tão impressionado que resolvi testar fazer outros projetos e acabei criando outros como um editor completo de animações no canvas (https://dannymation.vercel.app), uma brincadeira com o Twitter (https://twittergalaxy.vercel.app) e uma ferramenta que fiz pra minha filha, estudante de jornalismo) para extrair cenas de uma filmagem bruta de uma entrevista usando IA.

Ok, agora eu tenho um portfolio melhor pra mostrar. Fiz meu site (https://dannygomes.dev) porém mesmo assim as empresas continuam me ignorando. Foi então que descobri a existência dos ATS (Applicant Tracking System) e que provavelmente eu estava sendo filtrado já no início dos processos por essas ferramentas criadas no inferno, mesmo tendo meu LinkedIn cuidadosamente escrito de forma humana, interessante, de fácil leitura.

Resolvi pedir ajuda ao Grok pra otimizar meu CV e, acredite ou não, comecei a receber mais ofertas de vagas e a fazer mais entrevistas.

Infelizmente, aquelas três coisas que mencionei antes ainda continuam regendo as contratações do mercado e mesmo com um currículo ATS-proof agora (que o torna menos humano, feio e repetitivo pra uma máquina ler melhor), ainda tenho recebido muitas recusas, mesmo tendo construído tantas soluções com software nos últimos 13 anos (desde janeiro 2012). Mesmo eu tendo liderado equipes de 4-6 devs, mesmo eu tendo desenhado arquitetura de alguns sistemas, mesmo tendo participado de equipes de produto, de processo, de pentest, de auditoria. Nada disso importa. O que importa hoje é (relembrando):

  • O que você construiu e enviou pra produção nos últimos dois anos?
    Nada, pois eu estava ocupado cuidando da minha família, da cirurgia de minha filha e procurando emprego.
  • Pra quais Startups você trabalhou nos últimos 2 anos?
    Uma startup que me pagava pouco e que teve problemas financeiros.
  • Quem famoso você conhece na bolha dev?
    Nenhum pois nunca fui muito de socializar quando estava no meu auge da engenharia.

Essa é minha ruína, o mercado mudou muito, muito rápido e eu fiquei pra trás. Eu poderia ser gerente ou diretor de qualquer departamento de engenharia de qualquer empresa devido a tanto conhecimento e soft skills que adquiri ao longo de minha carreira mas, como não conheço ninguém da “beautiful people”, fiquei estagnado, congelado no tempo.

Pra não dizer que tudo é ruim, recentemente entrei em uma comunidade do Discord chamada “Indie Hacking Brasil” e fui concedido com o cargo de moderador e a primeira coisa que pensei foi:

“Com grandes poderes vem grandes responsabilidades”.

Tenho interagido diariamente com essa galera da comunidade, a maioria jovem, cheios de sonhos e planos pra suas carreiras e eu atuo às vezes como um conselheiro, o “tiozão” mais velho com experiência na área. Isso me faz bem e aos poucos vou me reinventando com tudo que tenho aprendido e ensinado ultimamente. Foi de lá que veio a sugestão de compartilhar minha jornada no Youtube, coisa que comecei a fazer (https://youtube.com/@programad) onde venho relatando minha jornada, meus desafios, meus planos e pretendo fazer também build-in-public de meu SaaS de gamificação.

Eu poderia continuar escrevendo e eventualmente lançaria um livro sobre o assunto porém quero me esforçar pra fazer isso em vídeo, dar a cara a tapa, me colocar em posição vulnerável, ser sincero e honesto comigo e com quem me assiste.

Continuo na busca por uma nova oportunidade. Considerando meu nível de conhecimento e habilidade com a língua inglesa ainda espero conseguir um novo emprego “na gringa” mas, no momento, não estou em posição de recusar nada já que as economias estão acabando novamente e o futuro, é mais incerto do que nunca.

Pra você que leu até aqui, fica meu agradecimento e também o meu pedido pra que me siga nas redes sociais e acompanhe minha jornada no Youtube.

See you in another life, brother.

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Hoje em dia ser um bom programador não basta, você precisa ser tech youtuber, ter projetos com usuários visitando, dentre vários outros requisitos. O mercado está pior do que eu imaginei, sinceramente eu nunca achei que quando fosse minha vez de entrar no mercado, ele exigiria mais do que 8 horas líquidas do meu dia, mas eu estava errado, hoje vejo que eles querem tudo, se você vacilar, até sua alma.

Espero que você consiga uma boa vaga e seja reconhecido pelo seu trabalho!

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Vou ser totalmente honesto, não li tudo. Pulei a primeira parte do inicio da sua caminhada. A segunda parte chamou mais a minha atenção.

Tenho 35 anos, comecei a ter a carteira assinada em 2011~2012 mais ou menos, mas aproximadamente 12 anos antes disso eu comecei brincando com mIRC scripting, depois JS, e até 2012 fiz alguns freelas, projetos pessoais e etc.

Algo que me chamou a atenção é que, de certa forma, você tem, de fato, experiência. Não sei se você está "pagando" por algumas escolhas de carreira, como ter parado por um tempo. Mas gostaria de saber, você sente que a sua idade pode ser um dos motivos dessa barreira? Como disse, tenho 35 anos, e sou Front-end Senior. As vezes quando paro pra refletir sinto que a minha idade, em algum ponto, vai pesar com muita força na balança. O que você acha disso?

Outra dúvida, já pensou em contratar alguém que te ajude com processos e entrevistas? Algum "coach" (bata na madeira) de RH talvez.

Por fim, mas não menos importante, o mercado realmente está NOJENTO, sinto que sou um cara muito abençoado por ter um emprego. Estou na mesma empresa há 4 anos, e acho que a melhor estratégia nesse momento seria apenas sair para uma empresa mais estável (não sei se ainda existem) ou esperar pra ganhar os 40% do FGTS. Trabalhar na gringa? (Não sou fluente, apenas arranho um uga buga em inglês) Já perdi o encanto. As boas empresas de fora você vai parir uma bigorna pra entrar, mesmo com indicações talvez seja mais fácil ganhar na mega sena. E as ruins (startups em sua maioria), além de ser dificil entrar, tenho medo da demissão. Imagine, você ganha um salário de 4~5k dolares (lindo demais) e em 4 meses te mandam embora? Não adianta de nada.

Obrigado pelo seu relato e espero, de coração, que essa fase passe logo. Consigo imaginar como deve ser uma gigantesca bola de fezes, pois já me imaginei nessa posição inumeras vezes.

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Acredito que a idade tem sido um fator sim. Nas entrevistas que faço, percebo que as empresas esperam alguém mais jovem, mais antenado com os jargões da atualidade, como se isso definisse competência. Se você não faz parte do "beautiful people" do momento, tudo vai ser mais difícil. Quem está estável, ok. Quem não está, vai ter dificuldade mesmo que tenha experiência. Infelizmente sinto que os mecanismos de contratação estão "quebrados", principalmente após o surgimento dos tais ATS, que nos retiram das buscas, só porque a gente não mencionou uma tecnologia associada a uma outra na mesma experiência, mesmo que você seja totalmente ninja nas duas separadas.

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